quarta-feira, 27 de julho de 2016

Julho amarelo: Brasil tem cerca de 1,5 milhão de infectados pela hepatite C. Coinfecção atinge 11% dos soropositivos



Nesta quinta-feira (28), o mundo celebra o Dia de Combate às Hepatites Virais. A data foi instituída em 2010 pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para conscientizar a população sobre a importância do diagnóstico precoce, da vacinação e do tratamento. Conhecida como doença silenciosa, as hepatites virais não apresentam sintomas em 90% dos casos. Nos demais 10%, aparecem alguns, como urina escura, pele amarela e, em algumas situações, sinais semelhantes aos de uma gripe. A coinfecção com o HIV é preocupante. Cerca de 11% dos soropositivos têm também o vírus da hepatite C. Veja o que mais você precisa saber sobre a doença:
Tipos, causas e transmissão
No Brasil, as hepatites virais mais comuns são os tipos A, B e C. Existem, ainda, os vírus D e E. Os danos mais graves causados pela doença podem ser cirrose e câncer. Além de vírus, o uso de medicamentos, álcool e outras drogas, doenças autoimunes, metabólicas e genéticas podem causar as hepatites.
Segundo o Ministério da Saúde, nas hepatites A e E, o vírus é transmitido pelo contato da mão suja de fezes com a boca ou por meio de água, alimentos e objetos contaminados por fezes. Porém, a maior parte dos casos A e E não causam doença crônica no fígado.
Já o vírus da hepatite B pode ser transmitido através do sangue contaminado e também pelo sexo -- por isso, a importância de usar camisinha sempre durante as relações sexuais. Esse tipo de hepatite não tem cura e, por isso, outra medida de prevenção extremamente importante é a vacina, disponível no SUS (Sistema Único de Saúde) para crianças, jovens e adultos até 49 anos – nesse caso, a vacina protege também contra a hepatite D já que, para adquiri-la, o paciente precisa ter também a B.
O contato com sangue contaminado, inclusive por meio da relação sexual, é uma das formas de transmissão da hepatite C. Outra forma é o compartilhamento de objetos, como alicates de unha, por exemplo, que devem ser sempre esterilizados. Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Sérgio Cimerman, "quem é infectado pelo vírus C pode desenvolver a forma crônica da doença ou não”.
Além dos danos ao fígado, como cirrose, câncer e insuficiência hepática, a hepatite C também pode levar à diabete, comprometer os rins e nervos e causar artrites em diferentes articulações.
A hepatite D também é transmitida pelo sangue e, da mesma maneira que os vírus B e C, exige cuidado com o compartilhamento de objetos, como escovas de dentes, seringas, depiladores e barbeadores portáteis.
Os números
*10 milhões de pessoas no mundo estão infectadas pelas hepatites virais, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde)
*95% destas, não sabem que têm a doença
*1% apenas tem acesso ao tratamento
*1,4 milhão morrem a cada ano no mundo
*mais de 170 milhões de pessoas em todo o mundo já foram infectadas pela hepatite C, segundo a OMS
*destas, 170 milhões de pessoas, cerca de 30%, também apresentam infecção pelo HIV.
*No Brasil, entre 1,4 e 1,7 milhão de pessoas estão infectadas pela hepatite C, segundo o Ministério da Saúde
*apenas 25% sabem que têm a doença
*30 anos é o tempo que a hepatite pode levar para se  manifestar
*90% dos casos de hepatite B são transmitidos por via sexual
*95% dos infectados por hepatite B se curam "espontaneamente"
*85% dos pacientes não tratados de hepatite C se tornam doentes crônicos
*11% das cerca de 830 mil pessoas com HIV no Brasil têm também hepatite C
Coinfecção
No Brasil, o número de coinfectados HIV/hepatite C também chama atenção. Um estudo mostrou que:
*80% dos usuários de drogas injetáveis portadores do HIV têm a hepatite C. Isso significa que 12% das pessoas com HIV no Brasil têm hepatite C. (leia mais)
*11% dos casos de hepatite C e 9% do tipo B, em São Paulo, entre 2007 e 2015, são de coinfectados com HIV. Os dados são do Programa Estadual de Hepatites Virais.
"Todo paciente com HIV precisa fazer exames de hepatite B e C. Ele pode ter sido infectado por estes vírus no momento que contraiu o HIV", explicou Cimerman (foto à direita).
Segundo o especialista, "o soropositivo que adquire o vírus da hepatite C tem uma evolução mais rápida da doença devido à própria imunodepressão. A tendência é de que este paciente evolua para cirrose e câncer de fígado, com progressão mais rápida”.
O Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais alerta que a coinfecção pela hepatite B em soropositivos aumenta em cinco a seis vezes o risco de se tornarem portadores crônicos da hepatite e de desenvolverem cirrose.
“O portador do HIV está entre os pacientes com prioridade para receber o tratamento da hepatite C no Brasil. Geralmente, é receitado o sofosbuvir e o daclastavir. E, se este paciente usa efavirenz, por exemplo, a dose do medicamento deve ser ajustada”, disse Sérgio Cimerman.
Ponto de vista da sociedade civil
O ativista Jeová Fragoso (foto esquerda), presidente do Grupo Esperança -- ONG de apoio aos portadores de hepatites em Santos (SP), afirmou que a doença é a segunda causa de morte entre as pessoas vivendo com HIV/aids.
 “Temos avançado na luta contra as hepatites virais, principalmente a C, mas ainda há muito que fazer. Em outubro passado, o Ministério da Saúde incorporou novas drogas no SUS [Sistema Único de Saúde] contra o vírus C. Lembro que naquele momento o ministro [na época, o  médico Arthur Chioro] dizia: ‘o novo tratamento será um divisor de águas, vamos conseguir resultados incríveis e é o que vem acontecendo´", comemorou Jeová.
O ativista descobriu ser portador da hepatite C já na fase cirrótica da doença.  "Muitos pacientes que estão sendo tratados com as novas drogas relataram que não tiveram sequer efeitos colaterais. E o mais importante é que o tratamento é curto, dura entre 12 e 24 semanas e a perspectiva de cura é de 90%."
O maior problema, segundo Jeová, é que o tratamento, além de caríssimo, não é indicado no protocolo clínico para todas as pessoas com hepatite C no Brasil.
"As novas medicações são indicadas a pacientes que não podiam receber os tratamentos ofertados anteriormente, entre eles os portadores de coinfecção com o HIV, cirrose descompensada, pré e pós-transplante e pacientes com má resposta à terapia com interferon, ou que não se curaram com tratamento anterior, ou seja, estão num grau bem avançado da doença. Acho que se o medicamento possibilita a cura, então, todos com hepatite C deveriam ter acesso, temos de rever este protocolo."
Jeová contou que os 26.800 tratamentos comprados pelo Ministério da Saúde no ano passado já foram entregues aos estados e municípios. "O estado de São Paulo recebeu 9.969 tratamentos de 12 semanas e 8.206 pacientes foram beneficiados até o momento. Alguns precisaram estender o tratamento para 24 semanas, então adquiriram dois tratamentos. Há ainda mais de 5.200 pacientes aptos para receber o tratamento em São Paulo na fila de espera."
O militante enumera as principais demandas da sociedade civil hoje:
*garantir que todos tenham acesso ao tratamento, independentemente do grau da doença
*incentivar o diagnóstico precoce - 80% das pessoas não sabem que estão infectadas
*exigir que os testes para detecção da hepatite B e C sejam incluídos nos exames de rotina ou em qualquer exame de sangue
*trabalhar para que haja campanhas constantes de alerta, não só no julho amarelo
*lutar para baixar o custo do tratamento, mesmo que seja necessária a quebra de patentes [Em 2015, o Ministério da Saúde pagou por comprimido de sofosbuvir 81,84 doláres, pelo daclastavir 30,36 e pelo simeprevir, 30,74. Num tratamento de 12 semanas são usados 84 comprimido/paciente de cada uma dessas drogas. O tratamento é uma combinação de pelo menos duas delas]
Julho amarelo
Julho foi adotado pelo Ministério da Saúde e pelo Comitê Estadual de Hepatites Virais como o mês de luta e prevenção das hepatites virais. Isso não significa que a prevenção à doença deva ser menor nos demais meses do ano. Pelo contrário, a cada dia deve-se aumentar a atenção, porque as hepatites virais são as principais causas de câncer no fígado.

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