A técnica de enfermagem aposentada Maria Conceição Macedo (foto), de 72 anos, lembra como se fosse hoje do momento em que se deparou com dois pacientes "abandonados" pelas famílias na enfermaria do Hospital Roberto Santos, em Salvador, no final dos anos 80, por serem portadores do HIV, à época recém-descoberto por pesquisadores. A matéria, assinada por Alan Tiago Alves, foi publicada, neste domingo (10) pelo G1. Leia a seguir:
Comovida, a então funcionária novata da unidade médica decidiu alugar uma casa com recursos próprios para abrigar os doentes -- um jovem de 18 anos, que era travesti, e um homem de 30 --, que não sabiam do paradeiro dos parentes.
Conceição diz que o episódio não sai da memória, quase três décadas depois, pelo fato de os dois terem sido os primeiros dos 850 portadores da doença - entre eles 70 crianças - que hoje ela se prontifica a ajudar. A baiana que passou a dedicar sua vida a crianças, jovens e adultos carentes infectados pelo vírus é fundadora de uma instituição beneficente que leva o seu nome e virou até tema de um livro -- que reúne depoimentos de amigos sobre sua trajetória de vida.
A obra, intitulada "Tia Conça: A nossa senhora, Conceição" (foto), foi lançada na última quarta-feira (6), na capital baiana. O livro tem, ao todo, 24 depoimentos, entre eles do líder espírita, José Medrado; do fundador do Grupo Gay da Bahia, Luiz Mott; e do cantor e compositor J. Velloso. O trabalho conta com desenhos feitos por crianças de dois a seis anos atendidas na creche da instituição (foto abaixo), denominada de Creche Casa VIHDA, no bairro da Liberdade. Os beneficiados pela instituição, a maioria atendidos desde criança, recebem cestas básicas, assistência para o tratamento e acompanhamento.
"O livro foi uma coisa muito boa. Fiquei muito gratificada por conta do reconhecimento. É quase uma biografia, mas sem nenhuma linha escrita por mim. Se fosse eu que tivesse falando no livro, muitas pessoas até poderiam duvidar das histórias contadas, mas são os outros que estão relatando. São pessoas de valor que me conhecem desde o início. Então, para mim, é muito mais importante que essas pessoas falem do que eu", destaca a Tia Conça, como é carinhosamente chamada. A mulher mantém atualmente, com ajuda de doações da sociedade civil e trabalhos de voluntários, 27 casas alugadas em diversos bairros de Salvador, que abrigam soropositivos.
Mesmo antes de fundar a Instituição Beneficente Conceição Macedo, há 28 anos, Tia Conça diz que já tinha o habito de ajudar os outros."Sempre gostei, desde a infância, de cuidar dos excluídos, dos discriminados. Assim que terminei meu curso técnico de enfermagem, nos anos 80, me esforcei para fazer um concurso público e trabalhar numa instituição pública, onde pudesse ajudar os mais pobres. Consegui realizar meu sonho em 1987, quando passei em primeiro lugar para atuar na emergência do HGE [Hospital Geral do Estado]. Decidi fazer enfermagem porque poderia ajudar muita gente, já que quem trabalha na área da saúde deve ter como foco não o dinheiro, mas o bem-estar os outros", afirma.
Após alugar a casa com dinheiro próprio para os dois pacientes do Hospital do Subúrbio, onde também passou a trabalhar após se formar, Conceição conheceu mais pessoas em situação de vulnerabilidade com o vírus HIV. Ela disse que passou a locar mais imóveis para abrigar a todos. "Há 20 anos, quem tinha HIV era visto como bicho, por ser uma doença adquirida. Por isso, essas pessoas eram excluídas e, sempre que eu via alguém assim, ajudava. Depois da casa para os dois pacientes, aluguei mais dois quarto em um sobrado também no Pelourinho. Era um local de tráfico e prostituição, as profissionais do sexo ficavam doentes e eu nunca negava ajuda", lembra.
Fonte : G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário