quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Temos que lutar pela hepatite como lutaríamos pela aids’, afirma coordenador do GTPI

“O que aconteceria se a cura da aids fosse encontrada, mas ela não estivesse disponível para todos?”, esse questionamento foi feito pelo coordenador de projetos da Abia (Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids) e  do GTPI (Grupo de Trabalho Sobre Propriedade Intelectual), Pedro Villardi, durante a mesa de encerramento, do Seminário Política de Acesso a medicamentos e Direitos Humanos, na tarde desta quarta-feira (28).
A pergunta foi feita porque um medicamento que gera 95% de chance de cura para a hepatite C existe. No entanto, o acesso a esse remédio é motivo de sofrimento para muitos pacientes, do Brasil e do mundo, que não podem pagar pelo seu alto custo. “Temos que lutar pela hepatite como lutaríamos se fosse a cura da aids”, continuou Villardi.
O tratamento feito com um comprimido por dia, durante 12 semanas ou 84 dias, com o sofosbuvir. A droga foi lançada no mercado pelo preço de 84 mil dólares o tratamento completo ou mil dólares por comprimido. Diante das reclamações de diversos países, a Gilead, companhia que detém a patente do remédio, sublicenciou 11 farmacêuticas indianas para que elas produzissem genéricos. Essa saída coloca o medicamento no custo de 840 dólares.
No entanto, para países como o Brasil, que tem cerca de 1,7 a 1,8 milhão de pessoas com hepatite C  e trabalha com um sistema gratuito e universal --o Sistema Único de Saúde--, esse valor ainda é muito elevado.
“Em menos de três anos, a Gilead [companhia detentora da patente] vendeu mais de 39 bilhões de dólares desse medicamento. Enquanto isso, mais de 700 mil pessoas morrem, por ano, pela falta desse remédio”, afirmou Arair Azambuja, do Movimento Brasileiro de Luta Contra as Hepatites Virais.
Por ser uma doença silenciosa, ou seja, que leva anos para que os primeiros sintomas apareçam. Quando a hepatite C é detectada, o paciente já está num estágio avançado. No entanto, diante das barreiras financeiras para comprar o medicamento, no Brasil, por exemplo, o SUS (Sistema Único de Saúde) tem atendido prioritariamente os casos mais graves.
Segundo Eloan Pinheiro, hoje consultora independente e ex-diretora executiva do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos) da Fiocruz, entre as causas que torna um paciente elegível a receber o tratamento que gera a cura, estão os com fibrose avançada, equivalente ao estagio F3 e F4 --F2 se o diagnóstico foi feito por meio de biopsia há mais de 3 anos-- e co-infectados pelo HIV. Porém, segundo lembrou Pedro Villard, uma pessoa em estágio F3, “fica com sequelas da doença para o resto da vida”.  “Não podemos esperar esse estágio para tratar pessoas”, disse Villard.
Outra evolução da doença como o câncer hepático, conforme mostrou Arair, de 2008 para 2014, o número de internações no país, feitas através do SUS, saltaram de 3,8 mil para 8 mil. “O serviço público reconhece que o número real é superior. E nós sabemos que essas pessoas dificilmente vão se curar”, lamentou .
Para Eloan, embora o número de óbitos em decorrência da hepatite C seja muito alto, o Brasil não conta com um orçamento ou leis que garantem direitos específicos para as pessoas com a doença. “Eu digo isso para vocês notarem que é só através dos movimentos sociais que se conquista alguma coisa. Nós temos leis para algumas patologias e zero para outras. As que têm leis são trabalhos dos movimentos. (...) É muito triste saber que as pessoas com hepatite estão morrendo e as chances delas receberem os medicamentos são muito pequenas.”
O que tem sido feito?
Conforme o GTPI, “o sofosbuvir foi desenvolvido por um custo muito baixo e com uso de financiamento público. Mas a corporação farmacêutica Gilead está tentando patentear o remédio para ter o poder de bloquear a entrada de genéricos no país. Nessas condições, a empresa poderá continuar cobrando preços altos, excluindo milhares de pessoas da cura da doença”.
“A sociedade diz que o preço está alto, mas o governo paga. Quando o governo não determina o preço para adquirir um produto, ele é conivente com as empresas e não com sua sociedade”, afirmou Eloan.
No momento, o GTPI tem apresentado argumentos ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) demonstrando que o pedido de patente feito pela Gilead para o sofosbuvir “é imerecido e deve ser rejeitado”. Para o Grupo, impedir o patenteamento do sofosbuvir é primordial para que milhões de pessoas possam receber o tratamento. “Por isso, em maio do ano passado, o GTPI enviou um primeiro subsidio ao exame, provando que o pedido de patente feito pela empresa Gilead no Brasil não cumpre requisitos de novidade e atividade inventiva. Na sequência”. A empresa reagiu apresentando novos argumentos ao INPI. O GTPI contra argumentou e está aguardando a avaliação do INPI.
O seminário que começou nesta segunda-feira (26) terminou hoje (28). Cerca de 150 pessoas participaram presencialmente do evento e 500 acompanharam transmissões online. Os vídeos das transmissões podem ser assistidosaqui.

Saiba mais


Serviço
De 26 a 28 de setembro
Das 9h às 18h
No Hotel Vila Galé. Rua Riachuelo, 124, Lapa, Rio de Janeiro - RJ

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