sexta-feira, 19 de maio de 2017

CineSesc recebe bate-papo sobre diversidade sexual no Dia Internacional de Luta Contra a Homofobia



O Brasil ocupa o primeiro lugar em homicídios de LGBTs nas Américas. De acordo com o último relatório da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais (ILGA), foram 340 mortes por motivação homofóbica, só em 2016. Nessa quarta-feira (18), Dia Internacional Contra a Homofobia, o Cinema da Vela, projeto do CineSesc, recebeu Elaine Pombo, integrante do coletivo Mães Pela Diversidade e o educador e ativista Beto de Jesus, um dos fundadores da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, para um bate-papo, mediado pela jornalista Roseli Tardelli, a respeito da diversidade sexual e luta contra a homofobia.
Elaine entrou para o coletivo por meio de uma indicação do filho Felipe Pombo, um jovem ativista, homossexual e soropositivo. “Muitas mães não sabem que ser homossexual é uma condição. Eu, por exemplo, passei por todos os traumas e dificuldades de entender tudo isso. Mas tudo depende de como você vai lidar com a situação daquele momento em diante. Depois, quando eu soube que meu filho era soropositivo todo o meu medo se transformou”, disse.
Foi por meio do Mães Pela Diversidade que Elaine trocou o medo pela informação: “Você começa a enxergar as coisas do lado de fora da caixinha. Sobre a homossexualidade do meu filho, eu achava que era uma fase que ia passar. Além da preocupação relacionada a homofobia, eu tive HIVfobia. Se eu tivesse mais informações, naquele momento, não teria passado pelo que passei. O coletivo me ajudou a enxergar as coisas de outra maneira.”
Para ela, os pais também precisam sair do armário e esse não é um processo fácil. “Saber a condição do seu filho e amá-lo é uma coisa, mas da porta para fora as questões são outras. Eu descobri que, o que outro pensa, é apenas o que o outro pensa e ponto. O seu avanço é não sentir mais medo.”
De acordo com Beto de Jesus, que atualmente é gerente de Prevenção, Testagem e Advocacy da AHF Brasil (Aids Healthcare Foundation), em todo 17 de maio é publicado um relatório com o ordenamento legal de todos os países em relação a população LGBT, “embora tenhamos um decréscimo [mundial] de leis punitivas e aberturas maiores de direitos no último ano, isso é uma informação que está no papel. Sabemos que a realidade é outra”, disse.
Atualmente, segundo Beto, 72 países têm leis punitivas com relação à homossexualidade e um terço deles fazem parte da ONU (Organização das Nações Unidas). Oito países tem pena de morte para essa população. No entanto, metade dos assassinatos de pessoas transexuais no mundo acontece no Brasil.
“Quando não se discute gênero nas escolas, nublamos a realidade. Retirar a discussão de gêneros desse espaço foi uma atitude pensada para atingir a população LGBT, mas ela afeta, diretamente, os direitos das mulheres. Vivemos em um Estado que paga salários menores para as mulheres, isso para a mesma função. Entre as mulheres paga-se menos para as negras e ainda menos para as trans”, afirma.
Outro ponto criticado pelo ativista é o termo LGBTfobia, segundo opina, o termo que esconde as diversas vulnerabilidades vividas pela população LGBT. “Quantos jovens gays negros morrem na periferia? Só nesse exemplo cito jovens, gays, negros e a periferia. Quando diferenciamos, garantimos os direitos das pessoas”, refletiu.
Retomar a base comunitária da Parada Gay
Faltando um mês para a Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, Beto de Jesus afirmou que, embora tenha nascido em manifestações, a Parada perdeu a base comunitária e não tem dialogado com o ativismo. “É um evento grande e por isso é difícil de administrar, mas se você fecha a organização para grupos menores, você perde a possibilidade de ter diferentes percepções. Pode ser difícil, mas tem que trazer mais grupos e coletivos para a conversa. Hoje isso só é feito a alguns dias do evento.”
O HIV e os jovens gays
Um levantamento da Secretaria de Estado da Saúde em 2016, realizado por meio de seu Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids (CRT/DST-Aids) mostra que, embora a mortalidade por aids esteja diminuindo no Estado, a detecção das novas infecções pelo HIV cresceu exponencialmente entre jovens gays em SP e este é um cenário nacional.
A taxa de mortalidade pela doença em 2015 foi de 6 por 100 mil habitantes, 23,5% a menos do que em 2006 e 73,8% inferior à registrada desde 1995. Em 2015, morreram 2.573 pessoas com aids em todo o Estado, o que representa uma média de sete óbitos por dia.
 Já a detecção de novas infecções pelo HIV entre homens que fazem sexo com homens apresentou aumento de 121% desde 2010, passando de 1.686 casos para 3.728 em 2015. No mesmo período a detecção entre homens heterossexuais também cresceu, mas em uma proporção bem menor: 28%.
 As taxas de detecção do HIV na população como um todo cresceram 4,2 vezes entre 2000 e 2015, passando de 4,2 para 17,6 casos por 100 mil habitantes no período. Mas entre os homens o crescimento no período foi muito maior: 6,5 vezes, contra 1,8 no caso das mulheres.
“Tem muitos gays que não gostam de falar de HIV. É como se isso não dissesse respeito a nossa comunidade, mas diz. Se as pessoas não falam o tema vai para debaixo da mesa. Os boletins trazem os jovens gays. Achávamos que isso era uma questão resolvida, mas voltamos para o inicio da epidemia”, observou Beto de Jesus.
PL 198
O Projeto de Lei (PL) 198 que quer tronar crime hediondo a transmissão do HIV também fez parte da conversa.  Roseli Tardelli observou que este caminho afasta as pessoas da testagem e em consequência do tratamento.
“Nós sabemos que além de atacar o sistema imunológico, o HIV inflama tecidos. Se a pessoa não faz o teste, ela adoece e morre. Os verdadeiros problemas são outros”, disse Beto de Jesus.   
O bate-papo durou aproximadamente 1 hora e 30 minutos. A conversa foi gravada e em breve será disponibilizado no site da Agência Aids e do Cinesesc.

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